Manifestações
artísticas de rua e a dificuldade de vencer o preconceito contra estas ações
Belo Horizonte é uma cidade conhecida por ser
pioneira e referência em seu posicionamento com relação a diversas questões.
Uma destas referências é a atual mobilização da sociedade civil, sobretudo
articuladores culturais, para fomentar uma cidade que possibilite múltiplas
expressões e permanências.
As manifestações hoje vividas na cidade são a priori um desejo
de liberdade para reproduzir as demandas de centenas de indivíduos que residem
na capital. Uma das demandas que com pouco tempo se mostrou óbvia e
imponente, é a fruição da cultura hip-hop, linguagem que é hoje assimilada sem
a sombra dos preconceitos que a perseguiram durante tantos anos.
O coletivo Família de Rua
é o realizador do duelo de MCS
há pelo menos 4 anos ininterruptos, e responsável pelo evento mais bem sucedido
que acontece hoje em um espaço público de Belo Horizonte. O evento que conta
com a presença semanal de mais de 2.000 pessoas, se transformou em um ponto
fixo de encontros e trocas. Desde a primeira edição do Duelo, o Coletivo
Família de Rua solicitou junto ao poder público parcerias para soluções
estruturais de organização e segurança no espaço urbano. Mesmo depois de
inúmeras reuniões e firmar diferentes acordos com as instituições responsáveis
pela gestão da cidade, as demandas não foram atendidas. Ironicamente, a Família
de Rua foi convocada para uma reunião em que foi solicitada a imediata
suspensão do Duelo de MCS e ainda uma possível transferência do encontro para
um local fechado. No entanto, o Duelo fez resistência e permanece com seu
percurso de transformações.
Contemplando os quatro elementos do HIP HOP, o Duelo de MCS
estimula além da música, a dança e as artes visuais. O grafite, elemento
fundamental como os outros dentro desta matemática, ainda sofre constante
preconceito da sociedade civil, como um claro reflexo da postura de nossas
autoridades com relação a esta prática. Um dos absurdos exemplos desta postura
é a prisão e enquadramento do grupo Piores de Belô,
como formação de quadrilha.
Estes, ficaram 117 dias na cadeia, sendo tratados como
criminosos da pior estirpe. Convenhamos, um cidadão que faz intervenções com tinta no
espaço urbano não poderia oferecer tanto perigo para a
sociedade. Poderia? Outra
taxada “gangue” que fez intervenções em locais aparentemente inadequados e
respondeu com crueldade jurídica foram os pixadores da 28° Bienal Internacional
de Artes, em São Paulo. Por volta de 40 pessoas invadiram a Bienal, e por ela
ser nomeada de “bienal do vazio”, fizeram uma intervenção gráfica. Todos
fugiram, exceto Caroline Pivetta. A menina de 24 anos na época, ficou presa por
53 dias e depois de solta foi condenada por quatro anos de prisão em regime
semiaberto, por formação de quadrilha e destruição de bem protegido por lei. O
curioso dessas duas situações, é que elas têm mais em comum do que parecem.
Ambas em um determinado momento, são legitimadas
para o uso e interesse de organizações poderosas.
Em Belo Horizonte recentemente, tivemos a notícia de que tem “grafiteiros” apoiando a candidatura de nosso atual prefeito Marcio Lacerda. Este que esteve no poder enquanto Os Piores de Belô foram presos e condenados por formação de quadrilha e por depredar o patrimônio, agora convida grafiteiros para produzir imagens e dizeres de apoio a sua candidatura? Já os membros da “gangue” de São Paulo, foram convidados especiais da 29° Bienal de São Paulo para expor seus trabalhos. Alguns artistas envolvidos tanto em um caso como em outro, salvas proporções, toparam. Fica no ar um questionamento desnorteador.
Quais são os mecanismos utilizados pelo poder, para manipular, controlar e legitimar a produção de arte em nosso país e estado, e quais posicionamentos devemos tomar? A mão que legitima é a mesma que condena.